Cinco anos do Centro Social Nossa Senhora do Parto

        *Por Flávia Muniz

        Fundado em 25 de março de 2014 - data em que a Igreja comemora a Anunciação do anjo Gabriel a Maria de que Ela seria a mãe do Filho de Deus - o Centro Social Nossa Senhora do Parto está completando cinco anos de intenso acompanhamento, valorização, resgate e promoção da cidadania de mulheres gestantes em situação de vulnerabilidade social. Os atendimentos acontecem diariamente na Capela Nossa Senhora do Parto, no Centro.

        Inspiração
        Segundo a assistente social e coordenadora técnica de apoio ao projeto, Silvia Gonzaga, o projeto já foi idealizado com o propósito de ser um cuidado com a mulher gestante em risco social. “Percebíamos que nós favorecíamos a vida, no nosso anúncio da Palavra de Deus. Mas precisávamos de um lugar concreto, onde a vida fosse tratada com muito respeito e carinho. Foi mesmo por indicação do padre Omar Raposo, reitor da capela na época, que viu no nome - Nossa Senhora do Parto - a grande inspiração do lugar ideal para acolhimento das gestantes em situação de rua ou em vulnerabilidade social, onde elas recebessem toda assistência e acompanhamento, para acolherem, também com todo amor e carinho, a nova vida que portavam consigo”, explicou.
Pelos dados da coordenação, cerca de 486 mulheres foram atendidas pelo projeto nesse período; uma grande parcela é de mulheres jovens e adolescentes:
“Hoje, está aumentando o atendimento a este público, o que antes não acontecia tanto. E fazemos um trabalho educativo com elas. No projeto não realizamos pré-natal, isso deve ser feito nas unidades de saúde, para onde elas serão encaminhadas, à época do parto, para as maternidades. Porém, sempre perguntamos se já iniciaram o pré-natal. Em caso negativo, este é o nosso primeiro passo com elas, e isso é, então, viabilizado”, disse.

        Amor e respeito
        Silvia declara que sempre se emociona com as histórias de vida, sobretudo após o nascimento dos bebês em condições bem melhores do que seria, se as mães não tivessem recebido o apoio e a assistência do centro social.
“Sempre me emociono. Cada criança que eu toco, pego no colo e olho reconheço como uma vida que foi, de fato, assumida. Algumas mães relatam como a gravidez assistida pelo nosso projeto foi diferencial na vida delas, pois muitas já tiveram outros filhos, porém - em alguns casos - elas jamais haviam experimentado o amor e o respeito que nós dedicamos a elas. E elas repercutem, para a criança, aquela experiência que elas estão tendo. Muitas são mulheres sozinhas e precisam experimentar, primeiro, algum tipo de amor e de respeito, para que consigam assumir a vida de seus filhos, pois a vida delas é muito marcada pela falta de amor e pelo desrespeito”, contou a coordenadora.

        Abrir-se à vida
        Ela relatou, também, que, dentre as muitas gestantes que vieram ao projeto, não foram poucas as que chegaram em situação de desespero e predispostas ao aborto, porém, com o atendimento recebido, “adquiriram as condições propícias para reverem sua decisão e, então, se abriram à vida. Hoje, temos centenas de bebês que nasceram amparados por essa atitude de atendimento e cuidado, antes de tudo, psicossocial, além das enfermeiras que também oferecem orientação e as educam no cuidado com a vida e com o próprio corpo”,  ressaltou ela.

        Promoção Humana
        Atuando no projeto desde a inauguração, Iranisi Muniz é a assistente social responsável pelo dia a dia do projeto: cadastramento, entrevistas e encaminhamento das grávidas, de acordo com as necessidades de cada uma delas. Além disso, ela também promove a captação dos recursos que viabilizam a capacitação e a autonomização dessas mulheres.
“Oferecemos cursos de empreendedorismo, maquiagem, tricô e primeiros cuidados com bebês. Além disso, temos atendimento psicológico, social, jurídico, terapia de família e fisioterapia; também distribuímos enxovais e fraldas. Por isso mesmo, nosso maior desafio, atualmente, é obter recursos para alcançarmos a efetiva capacitação delas para o mercado de trabalho. Precisamos também de ‘capital humano’: necessitamos muito de profissionais que colaborem conosco na capacitação e qualificação, bem como necessitamos de doações de fraldas, enxovais, leite e cestas básicas”, destacou Iranisi.

        Preconceito, juízos e vergonha
        Não são poucas as mulheres que sofrem com o preconceito, por serem pobres e negras, e o julgamento de familiares, vizinhos e dos seus companheiros, que as culpabilizam - sozinhas - pela gravidez.
“Sempre há contra essas mulheres muitas ironias, um julgamento, da mãe ou do companheiro: ‘Por que essa gravidez? Você não pode ter esse filho, mais um filho?’ Também durante o pré-natal as profissionais de saúde tratam com a mesma ironia, sugerindo: ‘até o ano que vem, tá? Nesse mesmo dia, nessa mesma maternidade’, envergonhando-as. Então, há um ‘coro’ para que elas não queiram ter os filhos. Isso demonstra um descaso pela vida. Quando estamos diante dessas gestantes, não podemos julgá-las, porque há milhares de situações por trás daquela mulher. Quem somos nós para julgá-las? É aqui que nós fazemos a diferença, com nosso olhar cristão: é uma vida que vem até nós, então devemos nos inclinar sobre ela e não provocar na mãe a rejeição ao filho, pela vergonha de estar grávida. Nós as ajudamos até nisso, a superarem a vergonha da gravidez”, ressaltou Silvia.

        Contracultura
        Atitudes como as descritas acima, segundo a coordenadora, induzem as mulheres a arriscarem o aborto, pondo em perigo suas próprias vidas e as de seus bebês. A assistência oferecida pelo centro social, no entanto, segundo Silvia, muda essa perspectiva, como contracultura à cultura de morte, porque reafirma a valorização e a escolha pelo direito à vida. Foi o que se deu com uma jovem mãe, que trazia uma mágoa muito grande de si mesma por ter ficado grávida de novo e havia se decidido pelo aborto.
“Ela chegou a preparar tudo, agendar o dia e local (em um desses locais clandestinos horríveis). E quando lá estava, na sala de espera, já com tudo certo, uma outra pessoa falou com ela sobre o nosso trabalho, dizendo: ‘vamos lá, só para você conhecer. Depois, você se decide’. Ela contou que veio até nós, e o jeito como foi recebida despertou nela um olhar sobre esse segundo filho como uma coisa boa, pois Iranisi a acolheu, dizendo que, para nós, era uma alegria poder ajudá-la e fazer parte da história dessa criança que nasceria. E, então, essa mãe saiu de lá decidida a não mais abortar. Algum tempo depois, ela a apresentou no ato religioso em defesa da vida que realizamos no Santuário Cristo Redentor”, contou.
Ainda segundo as assistentes sociais, a decisão de ter este filho melhorou até o relacionamento da jovem com o primeiro filho, porque, segundo a própria, ela entendeu, enfim, o que é ser mãe.

        Humanização
        Fatos como este demonstram que “ninguém pode dar aquilo que não tem, se nunca recebeu. Então vemos que o nosso trabalho ajuda também na humanização das pessoas, porque conosco elas passam pela experiência do amor. Por vezes, é tanto grito, é tanta violência e tanto julgamento, e quando elas percebem que existe respeito, carinho, existe jeito de falar, elas vão se humanizando. Por isso, também, é de suma importância o trabalho progressivo que fazemos com elas, através dos cursos. Além do empreendedorismo, elas também aprendem como cuidar da segurança das crianças em casa e a educar os filhos sem gritar nem espancar. É, então, um aprendizado contínuo para uma humanização constante”, concluiu Silvia.

        Atendimento
        O Centro Social Nossa Senhora do Parto presta atendimento às gestantes de segunda a sexta-feira, das 14h às 18h. Informações na secretaria da Capela Nossa Senhora do Parto, situada na Rua Rodrigo Silva, 7 - Centro, ou pelo telefone: 2292-8892.

* Foto: Fernando Pessanha